Foi criada em Maringá, na semana passada, um núcleo da “Comissão da Verdade”, instituída pela presidente Dilmar Rousseff, para apurar os crimes cometidos pela Ditadura Militar no Brasil. A intenção é lançar luz sobre um período negro da história brasileira nos 20 anos do regime militar, que teve início em 1964. Em Maringá, o grupo irá reunir documentos de entidades, como Igreja, OAB, sindicatos, teses, estudos acadêmicos dos núcleos de pesquisa na área da Universidade Estadual de Maringá.
Um dos coordenadores do núcleo local da “Comissão da Verdade”, o professor doutor em História Política da UEM, Reginaldo Dias, diz que a intenção é do grupo é contribuição com a comissão nacional. Maringá, segundo ele, teve papel importante na resistência à Ditadura. Muitos foram presos e torturados.
Qual a finalidade do núcleo local da “Comissão da Verdade”?
Reginaldo Dias: Alimentar o debate, colocar à disposição os trabalhos
que foram produzidos aqui na universidade e colhidos em entidades, como
Igreja, sindicatos. Nosso principal foco é agregar reflexões sobre tudo o
que aconteceu, que é algo antigo, mas é preciso que os jovens vejam a
sua importância.
Quem está à frente deste núcleo?
Reginaldo Dias: Os núcleos de pesquisa da UEM nesta área. Este trabalho
será coordenado pelos professores Sidnei José Munhoz, Ângelo Priori e
por mim.
Quais temas serão abordados?
Reginaldo Dias: São dois temas sensíveis: o primeiro são os mortos e
desaparecidos, queremos saber as condições dessas mortes, e o segundo
são os arquivos, pois para se chegar à verdade tem que abrir as
informações. Existe hoje uma barreira para atingir aqueles arquivos que
possam dar informações sobre os mortos e desaparecidos.
Quantas pessoas morreram durante a Ditadura?
Reginaldo Dias: Foram algumas centenas, entre mortos e desaparecidos,
mas o número pode ser ampliado dependendo do critério de inclusão. Fora
as mortes e os desaparecidos, tiveram os exilados, os que tiveram sua
vida inteira modificada por conta da repressão. Entre os mortos também
tem as pessoas que não morreram naquele momento, mas que perderam suas
vidas pela sequela daquele momento, que tiveram problemas psíquicos, que
se suicidaram por conta do que aconteceu durante a repressão.
Como a repressão agiu em Maringá?
Reginaldo Dias: Em Maringá haviam núcleos do Partido Comunista
Brasileiro (PCB) bastante influentes no movimento sindical, e tinha até
representação na Câmara Municipal. Tinha um vereador chamado Bonifácio
Martins, que era uma pessoa de visibilidade. É importante lembrar que o
PCB não tinha uma postura radical naquele momento, não queriam tomar o
poder, eles estavam mais preocupados em organizar sindicatos, em avançar
nos direitos. Essas pessoas que participavam do movimento sindical, que
tinham um engajamento social eram muito visadas. No projeto “Brasil
Nunca Mais”, existem documentos sobre Maringá. Nele, mostra que foram
indiciadas cinco pessoas, entre eles o vereador Bonifácio Martins, o
sindicalista José Lopez dos Santos e o advogado Jorge Radad.
A pressão pela queda do presidente João Goulart teve eco em Maringá?
Reginaldo Dias: Diversas entidades apoiaram a derrubada do presidente,
com medo que ele fizesse leis que facilitassem o comunismo no Brasil. As
principais autoridades em Maringá, e no Brasil, apoiaram. Desde
prefeito, bispos, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) foram a favor no
primeiro momento, achando que era uma medida temporária. Quando viram
que o governo militar não sairia, foram formados novos núcleos de
resistência. Em 1968, Maringá teve muitas greves que se opunham à
política do governo federal, o que fez com que o DOPS (Departamento de
Ordem Política e Social) monitorasse muito Maringá.
Muitas pessoas foram presas aqui?
Reginaldo Dias: Tivemos muitos presos, com torturas, diversos estudantes
sofreram, um deles foi o Laércio Sotto Maior, a professa aposentada da
UEM Ruth Lima, que sofreu muita tortura.
E mortes em Maringá, ocorreram?
Reginaldo Dias: Diretamente que eu tenha notícia não. Mas temos famílias
radicadas em Maringá, que se empenharam muito na busca de seus entes.
Como no caso do ex-deputado João Preis, que foi candidato a prefeito.
Levou 20 anos para fazer um enterro para seu irmão, o Arnald Preis, e
existe ainda hoje uma luta para se descobrir as condições da morte dele,
que aconteceu em Tocantins. Existem ainda muitas famílias que precisam
de informações. Acho que esta deve ser a grande contribuição da
“Comissão da Verdade”.
http://www.hnews.com.br/2012/06/anos-de-chumbo-em-maringa/