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'As mudanças mais contundentes têm de ocorrer em prazo mais curto'

Sem modificar as estruturas das relações capitalistas, os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) estão fadados ao fracasso. Esta é a avaliação da professora de ciência política do departamento de Ciências Sociais e pesquisadora dos núcleos Unitrabalho e Observatório das Metrópoles, todos da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Celene Tonella.

Reconhecendo que as soluções não são fáceis, a pesquisadora - pós-doutorada em Ciências Públicas - investe na transformação das estruturas para que elas cheguem mais rápido. "Vinte e cinco anos para as pessoas se conscientizarem- Não! Temos de garantir as mudanças já."

O Diário - Iniciativas como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, de fato, funcionam?

Celene Tonella - É preciso verificar o quanto as pessoas que estão à frente dessa proposta têm condições ou vontade de mexer com estruturas profundas que regem as relações capitalistas. Para acabar com a fome e a miséria não basta oferecer cesta básica.

É preciso mudar a forma da produção capitalista de alimentos que visa ao lucro, que ocupa grandes extensões de terra visando ao mercado exportador e não o mercado interno, e isso mexe com interesses muito poderosos, interna e externamente. Veja as multinacionais, que ditam o preço da soja e determinam como ela será exportada, só para citar um exemplo.


No mundo, milhões de pessoas não têm acesso ao saneamento básico. Inclusive os quase 100 mil habitantes de Sarandi. A proximidade dos problemas é proporcional à dificuldade das soluções?

Sim. As soluções não são fáceis. Por isso, por mais vontade que as pessoas tenham, as mudanças pressupõem mexer com interesses estruturais profundos e também envolver a maior parte da população. Um dos Objetivos do Milênio fala em todo mundo trabalhando pelo desenvolvimento. Ora, o modelo de desenvolvimento que temos é desequilibrado e excludente, que agride o meio ambiente. E os mais prejudicados, sempre de forma mais imediata, são os mais pobres.

Falar em desenvolvimento hoje em dia está até fora de moda. Ele tem que ser qualificado. Se queremos transformar, as propostas têm de ser includentes, para que os mais pobres consigam viver com dignidade, a partir do fruto do seu trabalho, e não como clientela da assistência social.


Curiosamente, Maringá está sediando dois eventos que estão tratando do mesmo assunto, o Seminário de Agroecologia e o Círculo de Diálogo...

Podemos dizer que estamos sediando o Fórum Econômico de Davos e o Fórum Social Mundial. A gramática que rege o Seminário de Economia Solidária é o da transformação. Transformar as estruturas, dar condições para a permanência do agricultor no campo, de dignidade para as pessoas que habitam os espaços urbanos e de garantia de trabalho. Até para que, em um futuro próximo, não sejamos atingidos pelas catástrofes naturais, mas que são provocadas pela superexploração do planeta.


Você acredita que 25 anos são tempo suficiente para que as pessoas se conscientizem sobre a necessidade de mudanças?

Na minha opinião, as mudanças mais contundentes têm de ocorrer em prazo mais curto ainda. Vinte anos para as pessoas se conscientizarem? Não, temos de garantir as mudanças já. Demorou!