Passista da Mangueira, Ana Lúcia da Silva elegeu os sambas enredo para sua tese de doutorado

Ana Lúcia da Silva, professora do Departamento de História na UEM, se orgulha de ser passista da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. Lazer à parte, o samba também permeia sua vida acadêmica. Desde que lecionava em uma faculdade da região, Ana Lu (como os amigos a chamam) usava este ritmo tipicamente nacional para ensinar sobre a cultura afro-brasileira. “As pessoas não entendiam o samba como parte historiográfica da cultura afro-brasileira e batiam na porta para conferir se realmente estava tendo aula”, conta a professora.

Em 2015, ela começou o curso de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Educação da UEM. Escolheu os sambas enredo do carnaval carioca como tema para sua pesquisa: "Pedagogias culturais nos sambas-enredo do carnaval carioca (2000-2013): A História da África e cultura afro-brasileira". Ana Lu apresentou o projeto para a orientadora Teresa Kazuko Teruya que gostou e aprovou logo a proposta.

“Minha tese foi sobre sambas enredo do carnaval carioca”

O primeiro passo da pesquisa foi fazer um mapeamento dos sambas enredo de 2000, ano em o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso convidou todas as escolas de sambas do Rio de Janeiro para apresentarem um enredo que celebrasse os 500 anos do Brasil. A Estação Primeira de Mangueira levou para a avenida um samba enredo sobre Dom Obá. Na época, Ana Lu não sabia se era uma alegoria, pois contava a história de um homem negro, livre que foi para a guerra do Paraguai, (que durou de 1864 – 1870), voltou e foi condecorado por Dom Pedro II. A partir da condecoração de Dom Obá, foi publicado nos jornais da época que todo negro que havia ido para a guerra teria que ganhar a liberdade.
“Achei curioso nunca ter ouvido essa história no colégio e na faculdade”, declara Ana, que Integra o Movimento Negro de Maringá. Escolheu mapear os sambas enredo desde 2000, destacando que a Mangueira tem um ato de resistência a partir do samba, inclusive questionando o que o negro teria a celebrar nos 500 anos de Brasil.

Em 2018, Ana Lu viajou até o Rio de Janeiro para fazer um estudo etnográfico, conhecendo o universo do samba pessoalmente, pela vivência, já que a banca que a qualificou indagou a respeito das dificuldades de pesquisar o samba conhecendo apenas obras literárias e programas de TV.

“Gostar de samba vem de casa”

A ligação com o o ritmo vem desde criança, nas lembranças da mãe desfilando como baiana pela Coração Verde, no carnaval de rua em Maringá. Ana Lu foi para o Rio com o entusiasmo das lembranças de infância. Conheceu o museu do samba onde coletou muitas informações, além de conviver um pouco com a realidade daquelas pessoas.

“Já tinha lido bastante, mas ir no museu do samba, nos pés do morro da Mangueira, serviu para perceber as raízes do nosso povo. É lindo ver nas exposições como homens e mulheres negras lutaram para que o samba fosse reconhecido”, destaca a professora do DHI.

Com o caderninho de anotações, Ana Lu passou as quatro noites de Carnaval na Sapucaí, observando todos os detalhes para compor sua tese. Ela relata que até chamava a atenção das pessoas que estavam à sua volta quando anotava ligeiramente as observações.

Ana percebeu duas coisas nessa viagem, a primeira foi a solidariedade que transparece entre pessoas do morro nesta festa nacional que é o carnaval, e a segunda foi que iria voltar para o Rio em todas as oportunidades que pudesse para comemorar com o povo.

Depois deste carnaval, a professora voltou para Maringá, apresentou a tese do doutorado e já ingressou em um outro doutorado em História, que faz atualmente. Em 2019, Ana voltou ao carnaval do Rio para comemorar, desfilou pela primeira vez na ala do museu do Samba da Mangueira.

Ela relata que fez muitas amizades e que se encantou ainda mais pela festa. “Uma escola de samba oferece muito lazer, alegria e além disso o ensino”, disse a passista referindo-se a capacidade dos sambas enredo de ensinar história.
Revigorada é a palavra que Ana Lu descreve quando volta para Maringá, com ainda mais entusiasmo em lecionar sobre a temática, que inclusive lhe rendeu um livro publicado.

Neste ano, a passista volta à Sapucaí, agora com os dois filhos, Inácio e Vitória. Ela diz que eles estão curiosos para saber como é realmente a festa, pois na televisão muitas vezes vemos aspectos rasos e negativos sobre o carnaval. “Vamos defender a escola juntos” entusiasma-se a professora.

Sobre a professora

Ana Lúcia da Silva nasceu em 1974, estudou em escolas públicas a vida toda e foi nesse período que se encantou com a disciplina de História. Fez a graduação em 1998 na UEM e logo após o mestrado em História, pelo Programa Associado UEM/UEL. Começou a trabalhar como professora temporária da Fafiman (Fundação Faculdade Filosofia Ciências e Letras de Mandaguari). Em 2005 participou do processo seletivo para docência na UEM.

Nessa época, Ana Lu trabalhou por dois contratos na universidade, mas teve que dar uma pausa devido ao nascimento dos filhos. Em 2015, ela começou o doutorado, também pela UEM, e fez o processo seletivo para dar aula como professora temporária na mesma época.

 

Texto: Natalia Luvizeto
Fotos: Natalia Luvizeto e Arquivo Pessoal

O amor pelo futebol e pelo time do coração rendeu fama e boas amizades ao Valtão

Com mais de 39 anos de UEM, Valter de Souza Pereira, mais conhecido como Valtão, hoje é servidor técnico aposentado. Trabalhou todos esses anos no laboratório de materiais de construção do curso de Engenharia Civil, onde cultivou muitas amizades.

Aposentado pela UEM desde 2016, sempre que pode ele vem ver os amigos e colegas de trabalho.

O jeito atencioso e paciente fez Valtão ser o primeiro servidor técnico patrono de turma, título que representa uma personalidade que foi inspiração para os formandos. Ele declara que a relação com os alunos era ótima e o reconhecimento nasceu do respeito e carinho entre eles. “O que eu fazia por eles era por amor à minha profissão”, conta. Valter, destaca que a amizade com muitos daqueles alunos se mantém até hoje, por meio das redes sociais. Ah! Valtão foi homenageado como patrono de turma por duas vezes.

“O que eu fazia por eles era por amor à minha profissão”

Outra prova de carinho foi a “Copa Valtão”, título que os alunos deram, em 2007, ao campeonato de futebol de salão do curso de Engenharia Civil. “Acompanho todos os jogos da competição”, garante. Para Valter, essa homenagem é um orgulho que carrega pela vida afora.

A iniciativa tem muito a ver com a grande paixão que ele alimenta pelo futebol. Palmeirense de carteirinha, Valter acompanha religiosamente as notícias sobre o esporte e sobre o time do coração. Para isso tem um aliado importante: o Lance, um conhecido jornal esportivo brasileiro.

Aliás, sobre o jornal ele lembra que certa vez, ainda quando trabalhava no laboratório de Engenharia Civil, teve um contratempo e não pode passar na banca para pegar o periódico. Para não ficar por fora das notícias pediu a um aluno para lhe trazer o Lance. Só que ao invés do jornal, o acadêmico lhe trouxe um chocolate com o mesmo nome. “O episódio acabou rendendo boas risadas”, relembra Valter, destacando que a história exemplifica o bom convívio que havia no laboratório.

Formado em História aqui na UEM, Valtão também trabalhou por alguns anos como comentarista esportivo em diversas rádios comunitárias da cidade. Apesar de gostar de narrar os jogos, ele parou de exercer a profissão para começar uma nova atividade: ser treinador.

Atualmente, ele treina um time de futebol suíço chamado “Valtão da UEM” que, segundo ele, tem muito potencial e vem de uma série de vitórias consecutivas “Sinto satisfação enorme em conseguir atuar de alguma maneira no mundo do futebol”, confessa.   

Texto e fotos: Natalia Luvizeto

Sem receber nada em troca, apenas pelo prazer de trabalhar em prol do bem comum, “seu” Pedro cuida da ATI com esmero

Com uma boa conversa e muita disposição, Pedro Antônio Edere faz a diferença nas tardes de muitas pessoas que passam pela ATI (Academia da Terceira Idade), localizada aqui na UEM.

Voluntariamente, este mineiro de 79 anos limpa e cuida do local desde que a academia foi implantada. Ele conta que manter o local sempre limpo lhe faz bem para a saúde e para a alma, é como se cumprisse uma missão. “Quando chega o fim da tarde e já terminei minhas atividades é a hora de voltar pra casa”.

Nem sempre foi assim, antes da aposentadoria ele garante que trabalhou muito para manter a casa e conquistar suas coisas. Em um dos trabalhos, na Prefeitura de Goioerê, “seu” Pedro sofreu um acidente que lhe causou uma lesão no pé, que não o impediu de continuar com as atividades. Ele conta que um amigo sapateiro fez um par de sapatos ideal, confortável e que lhe oferece muita estabilidade.

Depois que veio para Maringá, em 1963, “seu” Pedro começou a trabalhar como corretor de imóveis. Vendeu mais de 30 casas e apartamentos perto da universidade e foi dessa forma que fez amigos que mantém até hoje. Sobre a profissão ele diz que foi preciso aprender a vender de maneira eficiente, destacando a boa conversa como princípio importante.

Divorciado e com três filhos, tem uma boa relação com a família, mas destaca que prefere viver no seu “cantinho”, um apartamento “vizinho da UEM” e que divide com outros dois rapazes.

“Fazer isso é um remédio pra mim...”

Já é um hábito, “seu” Pedro se desloca todos os dias até a ATI, que fica ao lado do Bloco J-12, a partir das 15h00. “Fazer isso é um remédio pra mim, muitas vezes saio de casa doente, venho pra cá e já me sinto melhor”. Além de fazer seus exercícios diários, ele varre o local, improvisa concertos para os equipamentos que estão danificados e cuida das árvores próximas da academia.

Tudo isso chama a atenção daqueles que frequentam ou passam pelo local, ver e descobrir neste mineiro uma pessoa amigável, que mesmo com algumas limitações física, pensa no bem comum.

Sem receber nenhuma recompensa em troca do serviço que presta, “seu” Pedro garante que é feliz com a vida que leva. “Gosto de fazer minhas atividades, encontrar meus amigos e chegar em casa, no fim de um longo dia, assistir minha novelinha, é uma vida de rei não é mesmo?!”.

Texto e fotos: Natália Luvizeto

Predadora de livros

Texto e fotos: Natália Luvizeto

O calendário marcava a virada de milênio quando Marta Bellini, professora associada do Departamento de Fundamentos da Educação, decidiu começar um ambicioso e cativante projeto: a criação de uma biblioteca em sua própria casa.

O sonho nasceu de uma iniciativa chamada Café com Ciência, criado por ela para levar conhecimento e atividade científica para a comunidade. Daí para a criação da biblioteca não demorou muito.

A intenção inicial era abrir espaço para que as crianças da Vila Esperança, lugar onde mora até hoje, tivessem acesso à leitura. O projeto tomou uma proporção maior do que o esperado e durante três anos sua biblioteca particular foi um lugar de ensino, de experimentos e de convivência com as crianças do bairro e também com os acadêmicos da UEM, a maioria orientados por ela.

Das tantas histórias que coleciona, Marta relembra dos encontros que realizava com blogueiros e das sessões de cinema que fazia na biblioteca, que também eram frequentadas pelos discentes.

Ela destaca que a construção do espaço teve a participação de Valter Dubiela, então aluno de Arquitetura e Urbanismo na UEM. A biblioteca era apenas um sonho quando a professora compartilhou a ideia em uma conversa informal com Valter. Animado com o projeto, o então aluno de arquitetura incentivou Marta Bellini a tirá-lo do papel. Foi além, acabou presenteando-a com o projeto da obra, que não demoraria a começar. “Foram quatro meses até a biblioteca ser inaugurada”, diz a professora, relembrando a ebulição que foi aquele período de reforma.

[Marta, trouxe alguns livros]

Por falta de recursos, o ambiente é improvisado com estantes, guarda-roupa e móveis de cozinha que foram adaptados para para armazenar os inúmeros livros. Nem por isso, o espaço perdeu o charme. Quanto aos livros, Marta conta que alguns eram comprados, mas que em geral ganhava muitos exemplares. “Até hoje tem gente que aperta a campainha e fala: Marta, trouxe alguns livros”.

A professora conciliava a rotina entre a docência na UEM, os projetos da biblioteca e os textos do blog Cacarecos da Marta, no qual fazia resumos e fichamentos de livros. Atualmente a biblioteca e o blog estão em compasso de espera por falta de tempo e recursos. Mas a professora adianta que tem planos para retomá-los no ano que vem.

[Desde pequena fui iniciada nos livros]

A relação de Marta Bellini com a literatura começa muito antes da biblioteca. A inspiração veio por meio de uma tia avó que escrevia poesias e lhe dava para ler. Em pouco tempo aquela menina se encantaria com o mundo das letras e a paixão pelos livros crescesse a cada novo exemplar lido. “Eu entrava nos livros e vivia a história intensamente. Almoçava com a personagem, chorava, sorria...”, declara a professora.

Naqueles tempos, a literatura lhe impulsionava para “viajar” muito além dos limites da pequena Porto Ferreira, município do interior de São Paulo. Os livros, segundo ela, lhe ajudaram a ir longe e a ganhar um olhar diferente do mundo. Então ler já não era suficiente, Marta queria passar adiante sua paixão.

"Com 13 anos, decidi trabalhar na biblioteca da escola fazendo propaganda dos livros para os colegas, incentivando a prática da leitura. Um tempo depois, comecei a vender livros e a participar de um clube de leitura lá em Porto Ferreira".

“Sou uma predadora de livros”, é assim que Marta se autodenomina, referindo-se a quantidade de livros que lê por ano. Existe inclusive uma disputa entre ela e um colega da Universidade, para ver quem consegue ler mais livros. “Sempre perco”, confessa. Mas garante que compete em igualdade de condições.

Muito mais do que apenas uma história, para Marta Bellini, os livros têm a capacidade de humanizar, de trazer a poesia à vida, “A cada final de ano eu mergulho na literatura para resgatar aquilo que eu chamo de humanidade “.

[Foi aqui que me encontrei]

Marta cursou Ciências Biológicas e logo depois decidiu fazer mestrado em Educação. Quando terminou o mestrado começou a procurar emprego, prestou concurso para várias universidades até entrar na UEM em 1986. Marta chegou e logo conquistou amigos, conheceu muitas histórias e fez parte de outras tantas também. “Foi aqui que me encontrei”, sintetiza

A professora, que já era engajada em movimentos sociais, chegou e já abraçou a luta estudantil. Quem a conhece sabe que ela não é de meias palavras. “Se tiver que falar eu falo”, diz a professora que não tolera o desrespeito. Polêmica, suas posições firmes normalmente garantem repercussões para além dos muros da Universidade. Mas são exatamente elas que conquistam muitos seguidores, inclusive nas redes sociais.

Controvérsias à parte, a predadora de livros natural de Porto Ferreira finaliza a conversa reforçando que a leitura lhe trouxe muitos ganhos. Se é verdade que a vida imita a arte? Difícil dizer. O fato é que pode testemunhar, no cotidiano, a repetição de muitas histórias que acompanhou na ficção.