Neiab: Entrevista com Marivânia Conceição de Araujo

Marivânia Conceição de Araujo é professora e coordenadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiros (NEIAB). Em entrevista ao #NossaUEM, ela fala sobre a importância do Núcleo, Dia Nacional da Consciência Negra (comemorado em 20 de novembro) e sobre cotas

#NossaUEM - Em Maringá o dia da Consciência Negra não é considerado feriado. O que isso pode significar e qual a importância dessa data?

MCA - O dia 20 de novembro celebra a existência e a luta de Zumbi dos Palmares, um herói que lutou contra a escravidão. Esse dia é pensado não só para celebrar um herói negro, mas para que possamos discutir sobre a desigualdade racial, racismo, preconceito, a dificuldade que a população negra enfrenta  e para construir uma consciência negra, de negritude.

O negro tem uma identidade mas é constantemente diminuída, fragilizada e historicamente invisibilizada, por isso é necessário fazer essa exaltação e estimular essa consciência, para que haja um movimento de integração, igualdade e valorização da diversidade.

O feriado valoriza a data e a luta. Vejo com tristeza que em Maringá e em muitas cidades do País, a data é praticamente esquecida. Acredito que isso é reflexo de uma sociedade desigual que busca invisibilizar a população negra.

#NossaUEM – Qual o papel do NEIAB neste contexto? E qual a importância do núcleo para a UEM?

MCA – O Neiab foi criado há cerca de treze anos com o intuito de ampliar o debate sobre as questões raciais. É um grupo que age politicamente em favor da igualdade e nesta perspectiva produz conhecimento, procurando fazer com que as ideias pautem discussões para além do âmbito do NEIAB, com acesso geral às pessoas interessadas no tema. Por isso temos o site, as redes sociais e três livros publicados. Um deles é direcionado aos professores da educação básica e trata da cultura afro-brasileira. A produção foi coordenada pelo professor Delton Aparecido Felipe e está disponível on-line (para acessar a obra clique neste link).

A importância de  ter um núcleo que abra espaço para  discussões que vão além da perspectiva eurocêntrica comum é inegável, tendo em vista a diversidade cultural e racial do país e os inúmeros temas ligados à temática. Fico satisfeita em dizer que contamos com apoio da atual gestão da UEM, e das anteriores também, no desenvolvimento das nossas ações.

#NossaUEM – A UEM aprovou o sistema cotas raciais. Em que medida estas cotas são benéficas no combate ao racismo na sociedade brasileira?

MCA - Esta é uma resposta longa, mas vou tentar exemplificar para ficar mais fácil: Imaginemos uma família em que um gosta de esporte, outro de cinema, outro de literatura e quando estas pessoas com diferentes gostos se reúnem, a conversa será muito mais interessante, pois será um ambiente rico em conhecimento. Trazendo esse exemplo para a Universidade, se ela recebe pessoas de diferentes classes, diferentes cores e histórias vai ganhar, verdadeiramente, o caráter de universalidade, que diz respeito a universo, quantidade e pluralidade.

Dentro desta perspectiva, quando nós convivemos com pessoas diferentes os preconceitos e estereótipos terão grandes chances de diminuir e então vamos conhecer as pessoas no que realmente elas são, seu potencial. Essa população que está fora da universidade por um processo histórico, quando entra ela é mais um elemento positivo que traz qualidade acadêmica e diversidade.

As cotas são necessárias e são positivas, tanto internamente (acadêmicas), mas também profissional e social. Quanto maior o número de profissionais negros em cargos cujas profissões são consideradas de elite, melhor pra nossa sociedade e para a população negra, pois vai diminuir o preconceito. Muito do nosso preconceito racial tem uma raiz histórica, vem lá da escravidão e, por mais incrível que pareça, as pessoas negras ainda têm uma relação com pessoas escravizadas, já que a maioria está em cargos subalternos. Quando se abre a possibilidade para a inserção na universidade, barreiras se quebram e temos a possibilidade de diminuição do racismo, preconceito na nossa sociedade.

#NossaUEM – Em uma perspectiva futura, como você vê o aumento das manifestações políticas e culturais afro-brasileiras no câmpus?

MCA – Eu vejo isso muito positivamente. É superbacana quando temos contato com outras culturas e quando a gente pensa na universidade, alunos e professores fazendo uma produção cultural relacionada à cultura afro-brasileira. Eu acho ainda mais importante porque, historicamente, esse tipo de manifestação foi invisibilizada. Pior ainda, durante alguns anos algumas manifestações foram proibidas, como o samba, a capoeira e religiões de raízes africanas.

Então, quando a universidade traz essas manifestações, é bom, bonito, didático e é, principalmente, fortalecedor, pois elas têm sido, historicamente, perseguidas. Isso é exigência para que as pessoas respeitem a diferença. Cada um desenvolve a cultura que lhe é conveniente.

Por fim, gostaria de destacar uma frase da Angela Davis:

“Em uma sociedade racista, não basta não ser racista é preciso entrar na luta antirracista”.

É importante chamar a atenção não apenas para a resistência mas também para a inclusão. O Novembro Negro é pensado nesse sentido, uma luta contra o racismo na sociedade brasileira, que é diferente de uma luta da população negra contra o racismo, é uma luta geral, uma chamada para que as pessoas participarem dessa luta.

Texto e foto: Natalia Luvizeto