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Travesti Megg Oliveira, docente na UFPR, aponta que transgeneridade no Brasil remonta a pelo menos desde século 16

O 6º Simpósio Internacional em Educação Sexual (Sies) da Universidade Estadual de Maringá (UEM) foi finalizado hoje (26) com cerca de 150 trabalhos e 220 inscritos, com participantes de Estados como Amazonas, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e, é claro, do Paraná. “As questões de gênero e sexualidade não são discutidas tão constantemente na formação docente, que é o nosso objetivo. Os debates foram maravilhosos!”, avalia Eliane Rose Maio, psicóloga, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPE) da UEM e líder do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Diversidade Sexual (Nudisex).

Para ajudar a promover noções de equidade, diversidade, direitos humanos, não violência e não machismo, a mesa-redonda de encerramento, nesta sexta-feira, no Auditório 29 de Abril (Bloco I-12 da UEM), foi intitulada “Transexualidade, Intersexualidade e Feminismos”. Teve como protagonistas duas das primeiras negras transgênero a concluir doutorados no Brasil: a travesti Megg Rayara Gomes de Oliveira, docente do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e a mulher trans Jaqueline Gomes de Jesus, professora de Psicologia no Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ).

Oliveira falou sobre “Transexistências negras no Brasil: do apagamento ao direito de falar”. “Quando se discute sobre a comunidade trans no Brasil, está restrita à sociedade contemporânea. Na verdade não é isso, há trans no Brasil já nos primeiros anos do século 16, identificadas pelos registros policiais, porque foram denunciadas pelo Tribunal do Santo Ofício justamente por reivindicarem direito a uma existência que não estava em conformidade com o sexo biológico nem com uma identidade de gênero expressada de acordo com os padrões da sociedade vigente”. Ainda segundo ela, não são abordadas as questões étnico-raciais da população trans, o que faz com que negras trans sejam “silenciadas” e “apagadas” do mundo. “Se não falo sobre pertencimento racial, coloco todo mundo como branco”, declara Oliveira, que luta para que negros e principalmente trans escrevam mais artigos científicos. “Podemos falar com nós mesmas, temos autonomia para falar sobre a vivência trans”.

Já a temática de Gomes foi “Cisgeneridade: o lado oculto do discurso sobre a pessoa trans”. Ela aponta que quando discute-se sobre diversidade social, a tendência é abordar grupos excluídos, esquecendo-se dos privilegiados. Por exemplo: em gênero, falar de mulher; orientação sexual, homossexual; raça, negro; etnia, indígena; “mas, as pessoas se esquecem do aspecto dominante dessa dimensão de diversidade”. “Quando se fala em identidade de gênero, em geral foca-se na população trans, como se só ela tivesse identidade de gênero. As que não são trans precisam ser localizadas, precisa-se dizer o que significa esse lugar do privilégio, então, criou-se o conceito de cisgeneridade”, que é a classificação para quem identifica-se com gênero igual ao daquele estipulado em seus órgãos sexuais.

Em 2017, Gomes foi a primeira trans negra a receber a Medalha Chiquinha Gonzaga, na Câmara da cidade do Rio de Janeiro, entregue pelas mãos da então vereadora Marielle Franco, executada em 14 de março de 2018. “Muitas pessoas foram mortas e continuam sendo, considerando a conivência do governo federal ou de outras autoridades que não reconhecem a necessidade de valorização dos direitos humanos, e que defendem um discurso que promove a violência e a discriminação”, argumenta a doutora. No ano passado, enquanto era candidata a deputada estadual no Rio de Janeiro, Gomes sofreu uma cotovelada na rua. Como concorria pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e o agressor vestia roupas em verde e amarelo, acredita que a motivação tenha sido por oposição política, além de preconceito.

 

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Jaqueline Gomes de Jesus, mulher trans e professora de Psicologia no IFRJ, fala sobre privilegiados e discriminados

 

O Simpósio – Com o tema “Gênero, Sexualidades e diferenças: categorias de análise, (des)territórios de disputa”, o 6º Sies foi realizado de 24 a 26 de abril. Foi composto por 14 grupos de trabalho, palestras, mesas-redondas e mostra artística. Maio acredita que cada vez mais a diversidade precisa ser colocada nos espaços sociais. “O Brasil é o país que mais mata gays e travestis no mundo, mas é o que mais consome vídeos pornôs de travestis. Trabalhamos para lidar com essa falsa moralidade e hipocrisia”, finaliza a coordenadora geral do evento.

Durante o simpósio internacional também houve abertura para apresentação das seguintes instituições: organização não governamental (ONG) Maria do Ingá – Direitos da Mulher, Conselho Municipal da Mulher de Maringá, Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afrobrasileiros (Neiab) da UEM, Núcleo de Extensão Maria da Penha (Numape) da UEM e Associação Maringaense de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (AMLGBT). A primeira edição do Sies foi em 2009 e é realizado a cada dois anos.

 

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“As questões de gênero e sexualidade não são discutidas tão constantemente na formação docente”, lamenta Eliane Rose Maio, líder do Nudisex