O conferencista Roger Chartier 

Cerca de 600 pessoas assistiram à abertura do 2º Colóquio Internacional de Estudos Lingüísticos e Literários (Cielli), na tarde de ontem (13), no auditório da Unifama, em Maringá. O evento, que segue até amanhã, começou com as conferências dos professores europeus Roger Chartier, da francesa Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, e Carlos Reis, da Universidade de Coimbra (Portugal).

Os 2,2 mil inscritos são de todas as regiões do País, segundo o Programa de Pós-Graduação e Letras da UEM, promotora do colóquio. É a 10ª edição, 2ª de caráter internacional.

O estudante de Letras Paulo Valente, 24, e as amigas Joice e Aline enfrentaram cinco horas de avião desde Belém (PA) principalmente para ver os conferencistas. Antes da palestra, eles engrossaram a fila de participantes que pediam autógrafo e tiravam fotos com Roger Chartie. “Ele estuda os leitores, um grupo que não era estudado”, diz Paulo, explicando o motivo da tietagem.

Em mais de 40 minutos, o professor francês analisou o processo de produção do livro nos últimos séculos e a criação do atual conceito de literatura. Para ele, “o texto impresso está aberto à flexibilidade, à mobilidade, à intervenção” e por isso, não é individual. “O processo de publicação, seja qual for sua modalidade, é sempre um processo coletivo”, avaliou o francês.

Segundo ele, a partir do século 18, as composições passaram a ser vistas como “criações originais que expressam os sentimentos mais íntimos do autor”. Surgiram então as biografias literárias e adoção da ordem cronológica das publicações. Biógrafos de William Shakespeare, por exemplo, aprofundaram-se em sua obra para desvendar detalhes da vida do escritor, ainda objeto de caloroso debate. “As práticas editoriais (do século 18) inventaram o conceito de literatura”, disse o professor.

As personagens

Mais didático, Carlos Reis fez a plateia rir ao demonstrar a “refiguração” de personagens literários em caricaturas e os atores que as interpretam no cinema. Madame Bovary, criada por Gustave Flaubert, e Humbert Humbert — personagem de Lolita, de Nabokov — ganharam rostos gerados por um programa de computador semelhante ao usado pela polícia para retratar fugitivos (Face ID ED). São, segundo ele, amostras da “refiguração” que os personagens sofrem no mundo real.

“Somos conduzidos hoje a um conceito de figuração entendida como um processo construtivo da personagem. (...) Não lemos e não vemos a M. Bovary independente da atriz que a interpretou no cinema”, falou o português. Essa percepção atende aos princípios da “dualidade” e da “permutação” — por esta entende-se a liberdade dos personagens, que não respeitam fronteiras rígidas entre a ficção e o mundo real.

A análise é parte da narratologia, foco da palestra de Carlos Dias. Para ele, nem mesmo a linguagem digital diminuirá a importância da construção do personagem na literatura, o contrário do que pregou uma corrente francesa nos anos 1970. “Os escritores de hoje dão respostas criativas à sobrevivência do personagem”, considerou o professor. Leveza, rapidez e multiplicidade são características das descrições atuais dos personagens.

O evento reunirá ainda importantes pesquisadores brasileiros e será realizado conjuntamente com o 5º Colóquio de Estudos Linguísticos e Literários. Além das palestras, a programação inclui 58 simpósios, 1.200 trabalhos inscritos, seis mesas-redondas e dez minicursos. A programação do evento está no site www.cielli.com.br.

O professor Carlos Reis 

 O paraense Paulo, ao lado das amigas Aline (de vermelho) e Joice